A internação compulsória de usuários de drogas em situação de rua é urgente e necessária
A decisão do prefeito Eduardo Paes de tentar internar compulsoriamente os usuários de drogas suscitou um efervescente debate em setores intelectuais próximos à esquerda. Numa capciosa inversão dialética da realidade, alegam violação dos direitos humanos e higienismo social.
Diferentemente das alegações, Paes não pretende fazer a retirada indiscriminada de pessoas em situação de rua. Determinou apenas a internação dos notórios dependentes que, a exemplo do que ocorre no Centro de São Paulo, transformaram determinadas regiões da cidade em território livre para a prática de crimes.
Nesses locais, o intenso consumo de crack e quejandos, à luz do dia, emoldura um quadro de lamentável e profunda degradação humana. Contemplar a situação a partir de um debate acadêmico, com posições quase sempre inconclusivas dada a complexidade do tema, resulta em inadmissível desídia do poder público – omissão com capacidade de agravar a violação dos direitos humanos.
Não se falou em retirá-los com tiro, porrada e bomba pela polícia. Mas, sim, através da atuação de médicos e assistentes sociais, cuidadosamente preparados para a tarefa. A alegação de que saúde é direito e não obrigação é uma forma deplorável de contribuir para a manutenção do status quo – à espera onírica da geração de empregos aos borbotões e, da consequente, ascensão social desta parcela de excluídos. Mais do que compaixão, eles precisam de atenção imediata e efetiva. Não podem continuar ao relento, desassistidos, objetos apenas da ação policial como tem ocorrido. Não permitir a mudança de paradigma no encaminhamento do problema seria condená-los exclusivamente à truculência policial. Maior violação de direitos humanos não poderia haver.
Os adictos de nossas cracolândias não podem permanecer apenas como protagonistas de um certo niilismo sociológico que aprisiona parcela da esquerda brasileira, fazendo-a condenar todos os caminhos de ação objetiva neste terreno. Não há sequer uma tese propositiva destes setores. Resumem-se a tratar o problema com admoestações de uma suposta e discutível violação dos direitos humanos.
Embora não represente nem de longe a posição destes segmentos sociais, a postura ajuda a alimentar a narrativa absolutamente distorcida, da direita, de que a esquerda se alimenta da desgraça e da pobreza da sociedade. E distancia cada vez mais seus adeptos dos setores médios do eleitorado.
Cabe ao Ministério Público fazer o acompanhamento das abordagens, evitando excessos que poderiam descaracterizar a pretensão original do prefeito. No universo de pessoas em situação de rua, há trabalhadores que residem em bairros distantes; desempregados e outros vulneráveis que necessitam de abrigo com atenção social primária. A estes, devem ser oferecidos hotéis ou dormitórios populares com ajuda humanitária para reinseri-los no mercado de trabalho.
Aos adictos, que lamentavelmente já não possuem capacidade de discernimento, mergulhados no consumo obsessivo de drogas, não há outro caminho a não ser interna-los compulsoriamente. Exigir-lhes ponderação, equilíbrio para decidir se querem ou não retomar à vida normal, livres da compulsão pelas drogas, seria, aí sim, profundamente desumano. Com cuidado, zelo e abordagem profissional, ao contrário do que alegam os críticos, a ação poderá se converter numa demonstração inequívoca de apreço aos direitos humanos.
Retirar usuários das ruas não é o mesmo que amontoá-los em depósitos humanos com único propósito de profilaxia social em ruas e praças. Isto, por óbvio, seria inadmissível. Espera-se uma ação social profunda, consistente, com atenção médica efetiva, de modo a recuperá-los.
A esquerda não pode permanecer aprisionada a teses e dogmas ultrapassados que a afastaram de parcela expressiva da sociedade brasileira. A forma inconclusiva de abordagem deste tema, em meio a um debate ideológico estéril, impede qualquer ação imediata à espera talvez de um mundo mais justo.
A inação decorrente deste debate sem fim e, repito, inconclusivo, nos condena a apenas contemplar a degradação humana de parcelas cada vez mais expressivas da sociedade. Neste terreno é preciso mais pragmatismo e ação. Como disse Karl Marx: “Os filósofos limitam-se a interpretar o mundo de diversas formas; o que importa é modificá-lo.”
Fonte: Agenda do Poder
Ricardo Bruno
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